Maior
comunicador do rádio e da TV brasileira, Abelardo Barbosa costumava dizer que
"Na televisão nada se cria, tudo se copia".
Paradoxalmente,
não teve ninguém até hoje que conseguiu copiar a espontaneidade do Velho
Guerreiro.
Comandante
de extravagantes concursos de calouros, responsável por revelar grandes nomes
da música nacional e inventor de bordões infames, o apresentador agora é
homenageado em 'Chacrinha, o musical', que estreia dia 27 de março, no Teatro
Alfa, após uma temporada de sucesso no Rio.
No processo de criação de
Chacrinha, Stepan Nercessian evitou consultar vídeos e outros
documentos. "Só recorri a eles quando o personagem já estava construído,
apenas em busca de detalhes", comenta o ator, que impressiona pela
fidelidade nos gestos e tom de voz - Stepan exibe a mesma forma miúda de
andar do Velho Guerreiro, os abraços abertos para a plateia, a voz
rasgada ligeiramente rouca e até minúcias, como a forma de acertar os
óculos no rosto.
"Chacrinha obrigou a
televisão brasileira a encontrar uma nova linguagem graças às novidades
que trouxe em seu programa", observa Stepan. "Na Buzina do Chacrinha, a
câmera não ficava presa no tripé, pois tinha que correr atrás dele, que
se movimentava por todo o palco. Ele distribuía afeto para a plateia e o
público de casa. Era a personificação de um Brasil livre, solto."
A
divisão em dois atos do musical serve para mostrar a mudança radical na
vida de José Abelardo Barbosa de Medeiros, o pernambucano que não
concluiu o curso de medicina para se tornar locutor na Rádio Tupi do
Rio, em 1939, até se consagrar como Chacrinha, grande comunicador que
logo chegou à TV, fantasiado, com uma buzina estridente pendurada no
pescoço e sempre disposto a jogar, sem cerimônia, objetos no auditório,
de bacalhau a farinha.
"O primeiro ato mostra justamente
essa transformação", conta Leo Bahia, que vive o jovem Abelardo. "É como
se uma tela branca fosse, aos poucos, pintada com elementos
extravagantes como buzina, abacaxi, até se transformar em um retrato
vivo no segundo ato." Jovem notável que despontou com uma versão
descompromissada de The Book of Mormon, Bahia lembra que moldou seu
personagem a partir de observações de como Stepan compunha o seu. "Era
importante o público notar as pistas que explicam como Abelardo se
transformou em Chacrinha."
Essa transição mostra também
como a ansiedade se tornou cada vez mais constante na rotina de
Chacrinha, a ponto de torná-lo um homem extremamente raivoso fora de
cena, disparando palavrões e ofendendo as pessoas. Um dos alvos
principais foi José Bonifácio Sobrinho, o Boni, responsável pela
implantação do padrão Globo de qualidade, que alçou a emissora à
liderança no Brasil, mas que, muitas vezes, divergia em opiniões com
Chacrinha - o musical mostra constantemente eles trocando ofensas.
"Eram
dois perfeccionistas que buscavam a mesma finalidade, mas por caminhos
distintos", acredita Stepan. Ele conta que Boni assistiu a um ensaio,
antes da estreia no Rio, no ano passado. "Foi muito generoso, não mudou
nada, mesmo que seu personagem apareça, muitas vezes, como um vilão. Na
verdade, Boni sugeriu uma cena, que foi incluída: a conversa dele com
Florinda, mulher do comunicador, que resultou na reaproximação dos dois.
Com
um orçamento de R$ 12 milhões, a montagem é assinada pela Aventura
Entretenimento, maior produtora de musicais do País, e comprova o que
foi dito, nos anos 1970, pelo filósofo francês Edgar Morin - em visita
ao Brasil, ele assistiu ao programa de Chacrinha. Com o dom do improviso
e senhor de uma alegria circense, o apresentador impressionou o
intelectual estrangeiro, que elegeu o anárquico animador de plateias um
fenômeno da comunicação em massa.
Fonte: Estado de São Paulo/ Yahoo
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