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segunda-feira, 16 de março de 2015

O vinho é mais feminino do que masculino


O vinho é mais feminino do que masculino. Até semanticamente, porque tirando o substantivo que o designa, todos os outros são femininos: a vinha, a uva, a colheita, a safra, a garrafa, a taça ... e a folha de parreira que cobriu (?) dona Eva.



Mas a primeira "mulher do vinho" foi a Veuve Clicquot.
Viúva (donde o "veuve") aos 27 anos, bem no início do século 19, ela assumiu a vinícola da família e transformou a produção e o comércio do champagne num império. Tanto mercadológicamente falando quanto no imaginário do mundo do prazer.

A história da vinícola e desta grande mulher começa em 1772, quando o seu futuro sogro, Philippe Clicquot-Muiron, fundou um comércio de vinhos com o nome Clicquot. Seis anos mais tarde, o seu filho, François, casou-se com Nicole Barbe Ponsardin.
Mas em 1805 ele morre e Madame Clicquot ficou viúva e assumiu o controle dos negócios. A Casa Clicquot passou então a denominar-se Veuve Clicquot-Ponsardin. Surgia assim a marca VEUVE CLICQUOT.



Dedicada e exigente, Madame Clicquot tornou-se uma das primeiras "femmes d`affaires" dos tempos modernos. Tanto que liderou sucessivas comitivas internacionais, na Europa, promovendo a bebida. E chegou a exportar para quase todo o mundo "civilizado" --- inclusive para a Russia, sendo responsável pela difusão do hábito de beber champagne na corte dos czares.

Curiosidade: em 1816, as primeiras garrafas de Veuve Clicquot chegaram ao Brasil para atender uma encomenda feita por carta escrita de próprio punho pelo imperador D. Pedro II.
Madame Clicquot morreu em 29 de Julho de 1866, aos 89 anos, deixando uma bem estabelecida marca de champanhe.

Em segundo lugar, mas também uma guerreira, vem a Mme. Pommery (1819-1890) , a primeira do ramo a apostar nos rótulos desenhados por artistas e no design das garrafas.



E em terceiro, vem outra giganta: a emblemática Dona Antónia (1811-1896) que naufragou num rabelo (aquelas barcaças que singram o Rio Douro levando o vinho do Porto) junto com o marido. Só que ele morreu e ela sobreviveu graças às sete saias, que lhe serviram de boia. Mas não se salvou sozinha: salvou o vinho do Porto!


Detalhe: todas viveram muito. A Veuve Clicquot morreu com 89 anos, a Pommery com 71 e a Dona Antonia com 85. (Imaginem se vinho fizesse mal!)

Mas afora essas pioneiras, vinho como as mulheres bebem hoje é coisa de uns trinta anos para cá. As mulheres bebiam pouco, raramente e sem critério ou escolha pessoal de safra, tipo de uva, origem ou função (aperitivo, harmonização, celebração).

Hoje, tudo mudou. Cada vez mais mulheres apreciam bons vinhos — e também fazem bons vinhos. E o número de enólogas, sommelières, produtoras ou tudo junto, cresce de forma geométrica por esse mundo afora.

Tanto que há uma meia centena de associações SÓ de mulheres para apreciar, discutir e divulgar o vinho. Ou, simplesmente, que se reúnem para beber e conversar a respeito, como o "Groupe Femmes et Vins du Monde, na França; a confraria Mulheres & Vinho, no Recife (tel: 81-3034-6956); a confraria das Mulheres Enófilas, que funciona no Brasil desde 2003, com filiais em todos os estados; a confraria Amigas do Vinho, cuja foto do site está aqui embaixo.



o filiadas à International Women in Wine Association, com mais de 5 mil participantes -- e muitas outras.

Em Portugal, Filipa Pato. Com formação em Bordeaux, estágios na Argentina, Austrália e França, hoje Filipa Pato lidera o projeto FP Wines. Com o conceito que o vinho é uma questão de origem, a enóloga luta para que seus produtos demonstrem a forte identidade com o local onde são produzidas as uvas. "Não quero ter um vinho que se confunda com outro, do Novo Mundo, por exemplo", diz a mais badalada musa do vinho português do momento.

Na Argentina, Laura Catena ocupa, hoje, o ranking de uma das maiores personalidades do vinho argentino. Jovem, talentosa, filha de Nicolás Catena, o emblemático vitivinicultor daquele país, Laura estudou biologia em Harvard e medicina em Stanford, mas desde meados dos anos 1990, dedica-se exclusivamente à vitivinicultura. Hoje, além de vice-presidente e braço direito do pai nas Bodegas Catena Zapata, ela é proprietária das prestigiadas vinícolas Luca e La Posta.

No Brasil, para falar na mais recente apresentação, conheci a Ana Paula Valduga, que toca essa tradicionalíssima vinícola gaúcha.



E por falar nelas, existem vinhos femininos?

Vejamos: na França, se diz que o vinho de Bordeaux é masculino e os Bourgognes são femininos. No Piemonte, esta associação é feita com as uvas Nebbiolo e Barbera. As primeiras são masculinas e as segundas, femininas.

Maria Borio, presidente da Associazione Nazionale Le Donne Del Vino, entidade que congrega 150 mulheres proprietárias ou casadas com proprietários de vinícolas da Itália, diz que o principal objetivo desse grupo é divulgar o vinho entre as mulheres. Ela se preocupa com detalhes femininos na apresentação dos vinhos como, por exemplo, as garrafas e os rótulos.
Voilà.

Mas como se diz na gíria de telejornal (policial) "tá tudo dominado".

Tanto que em um número passado, a revista Rio-Show, das sextas-feiras de O Globo, traz na capa o "programa mulherzinha". Elas -- na night -- bebendo (espumante) e conversando. (Matéria da Patrícia Espinoza).



Na outra ponta -- o lado o nobre, até a "dona" Camilla Rosamaria (antes era Parker), duquesa da Cornualha (epa!), mulher do príncipe Charles entende de vinho: ela é presidente da Associação de Sommeliers da Inglaterra!



Mas do outro,(oh, céus!) a centenária marca de licor Cointreau escolheu como sua garota propaganda uma ex-atriz pornô -- Dita Von Teese (foto Google)



O que me salva, é que na semana passada, por exemplo, conheci a profissionalíssima Rejane Kawano, sommelière de saquê.

Por isso, e para finalizar as homenagens àmulher, ontem -- hoje e sempre -- nada melhor do que esse versinho do velho Mário Quintana: "entre as crinas do Sol, eu prefiro as tranças da Lua!"

Parabéns, meninas!
 Por Reinaldo Paes Barreto

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